O texto a seguir possui spoilers dos livros A Tormenta de Espadas, O Festim dos Corvos e A Dança dos Dragões que ainda não foram adaptados na série de TV. Leia por sua conta. The Mountain and the Viper adaptou os capítulos Dany V (pág 583), Dany VI (pág 730) e Tyrion X (pág. 718) de ATdEAlayne I (pág 285) e Alayne II (pág 519) de OFdC; Fedor II (pág 221) de ADdD.
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No começo da semana eu estava no metrô aqui em São Paulo e vi um menino lendo A Guerra dos Tronos. Me lembrei da época em que todas as pessoas no metrô estavam lendo os livros das Crônicas. Vocês se lembram disso? Isso aconteceu nas cidades de vocês também? Todo mundo estava lendo, meio que devorando a história por todos os poros e com todo fôlego que tinham. Era muito legal ver isso. Naquela época, de alguma forma os livros eram muito mais importantes, porque a série de TV ainda não havia adaptado A Tormenta de Espadas, e daí os grandes acontecimentos da história ainda estavam por vir. E todo mundo guardava os spoilers com bastante entusiasmo. As dores, os segredos e as jornadas dos personagens ainda não faziam um bar inteiro parar. Era muito mais difícil superar certas coisas quando os memes eram apenas piadas muito internas e a maioria dos nossos amigos não fazia ideia do que estávamos falando.

O duelo do julgamento de Tyrion, assim como o Casamento Vermelho, tomaram um novo corpo uma vez que Game of Thrones, a série mais popular da história da HBO, derramou sobre literalmente milhões e milhões de pessoas, algumas das cenas mais violentas e inconcebíveis que já tivemos o azar ou sorte de testemunhar. Daí, esse sentimento vira algo muito mais universal e diferente daquele que sentimos sentados naquele banco de metrô, com vergonha de chorar.

Acredite, eu não estou reclamando disso. Eu adoro o sucesso da série, acho que o Martin merece que sua obra seja conhecida por muitas e muitas pessoas e adoro fazer parte disso em tempo real. Mas fico um pouco melancólica ao pensar que estamos superando essas coisas muito rápido, sabe? A morte do Oberyn, mesmo nos livros, sem a presença sensível do Pedro Pascal, já era uma lance que ninguém conseguiu superar. Dar um rosto definitivo pra esse personagem, um ator tão bom e tão espirituoso, deveria deixar toda a relação com essa cena de duelo muito pior. E deixou, durante alguns dias, principalmente logo após a exibição do episódio. Mas sinto que hoje, enquanto você lê esse texto, já superamos. Mas porquê? Bom, antes, let’s recapitular…

 

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O episódio começa em Vila Toupeira, com aquela cena caricata da prostituta arrotando O Urso e a Bela Donzela, falando que alguém tem o pau pequeno e depois ameaçando matar um bebê. Seria mais uma noite de pura alegria e emoção na vida de Gilly se os deuses não tivessem preparado algo ainda mais especial pra ela.

Eu tive a sensação de que essa cena inicial foi dirigida pelo Neil Marshall e não pelo Alex Graves porque o clima dela, que é o clima de guerra noturno que ele vai abordar no episódio que vem, foi muito diferente de todo o resto do episódio, que optou por usar câmeras subjetivas e muitos closes (tirando a cena de luta). Quando vemos a câmera seguir os Thenn, Ygritte e Tormund em sua matança, dá pra perceber o quanto essa cena é diferente plasticamente das outras. É energético e bastante poderoso.

E aí tem um detalhe muito bacana que é o fato de Ygritte poupar a vida da Gilly. Como vimos com o menino Olly, os selvagens parecem ser mais delicados quando o assunto é criança, mas é interessante perceber que Ygritte pondera bastante antes de tomar uma decisão e colocar o dedos nos lábios em sinal de silêncio. Me recuso a acreditar em uma possível gravidez, David e Dan repetir a tragédia de Talisa seria tosqueira demais, embora essa temporada esteja sendo em alguns momentos uma grande repetição de velhos temas. Temos várias repetições nesse episódio, como o quase encontro dos Starks, a morte de Kenning que lembra muito a maneira como nocautearam Theon em Winterfell, o monólogo na cela como já vimos Tyrion fazer diversas vezes antes e por aí vai.

Daí depois cortamos pra cena dos amigos reunidos. Jon, Sam, Grenn, Pyp e Edd Doloroso, Os Trapalhões e os irmãos de verdade, que são bonzinhos, foram parar ali injustamente e não são figurantes em uma banda de metal ou tiozões do mal, como todo o resto da Patrulha. Embora essa cena tenha irritado muita gente por conta da tosca lagriminha escorrendo no rosto de Sam, tenho a sensação de que ela serviu pra mostrá-los juntos pela última ou penúltima vez, mostrar como eles se apoiam e se gostam. Pelo que vimos no trailer do episódio, pelo menos um deles parece que não irá voltar da batalha pra contar história, então… faz sentido.


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Do lado de fora de Meereen, um homem mergulha na água. Vemos os Imaculados se banhando e Verme Cinzento saindo por debaixo d’água, olhando para o outro lado. Ele observa as meninas tomando banho e entre elas está um Missandei nua.

Toda essas cenas de Missandei no rio, tendo o cabelo trançado por Daenerys e depois conversando com Verme cinzento na sala do trono tomaram bastante tempo do episódio (cinco minutos). A de Tyrion e Jaime na cela foi a mesma coisa, cinco minutos. Mas, tirando o fato de que Daenerys usou palavras muito inocentes pra falar sobre sexo com uma garota que já é crescida (pilar e pedras, que conceito), todas essas cenas ‘novas’ foram boas, de verdade. Eu não sei até que ponto a gente saber como o pau do Verme Cinzento funciona é relevante (pra história da série ou para as nossas vidas). Aliás, não funciona, ponto.

 

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Mas …o enredo criado foi bem doce e bucólico… E evoca talvez o amor jovem que veremos ainda mais na série como Myrcella, Tommen, ou até mesmo Sansa que agora está em poder de si mesma. Lembrando que a Nathalie Emmanuel foi promovida para o elenco regular e ela vai precisar ter história e coisas acontecendo pra ela. O esforço é bom, principalmente pra deixar atores negros terem sua própria história e incrementar o núcleo da Dany. Em um episódio onde a cabeça de um homem é esmagada… a gente precisar ter um pouquinho de açúcar.

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Em mais uma cena em que vemos o conceito dos corvos se banqueteando, Theon tem que enganar seu povo para tomar Fosso Cailin, enredo de A Dança dos Dragões em um dos capítulos mais fortes do personagem. Gente, o núcleo dos Bolton é perfeito na série. O Roose tem o ator perfeito, o Ramsay também, e o Theon eu nem preciso falar. Bem eu vou falar, pela 100ª vez: Alfie Allen entende cada centímetro desse personagem… por exemplo quando o guarda pergunta quem ele é, seus olhos enchem-se de lágrimas, e ele engole a saliva uma vez, e duas e três com medo de falar Theon Greyjoy. Aliás, e Ramsay fazendo-o colocar aquela luva com a mão faltando o dedo mindinho? Por isso não importa quantas incoerências a gente vê na história desse núcleo, os atores fazem tudo ficar um pouco mais equilibrado

Quais incoerência? Por exemplo, não se joga o mapa de Westeros no lixo. Para entrar em Fosso Cailin você precisa passar pelos cranogmanos, o povo de Howland Reed, papai de Jojen e Meera, o homem mais procurado de todos os tempos. Não se invade Fosso Cailin sem tomar de graça uma ou duas flechas envenenadas. E é por isso que os homens de ferro estão mais podres do que qualquer outra coisa nessa cena dos livros. Doentes e caindo mortos. Na série, eles simplesmente estão doentes por uma motivo X. Aliás, Ramsay meio que esclarece isso dizendo, no começo da cena queas lulas são fortes no mar, mas fora da água não têm ossos e entram em colapso”. O que tem bastante a ver na verdade, os homens de ferro não conseguem viver longe do mar. Saqueiam, matam, estupram, roubam mas sempre voltam. De todas as famílias, a tradição e a mitologia deles é a mais forte.

 

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A série se apega a alguns detalhes do livro que são bem respeitosos. Aliás, essa cena em si, tirando essas pequenas incoerências é bastante parecida com a original. A carcaça do cavalo, o estado de calamidade, e a própria postura dos homens de ferro, principalmente Kenning. A essa altura, nos livros, Balon Greyjoy já está morto. E isso é interessante porque a série pode usar a morte dele para fazer Theon fugir de Winterfell, por exemplo. Vamos ver…

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Todas as tomadas desse núcleo Bolton foram muito belas. O norte é belo. O texto de Roose Bolton é muito bacana: “Se cavalgar por 700 milhas nessa direção você ainda está no Norte “, diz ele. “Há 400 milhas para o outro lado e você ainda está no Norte, e 300 quilômetros em outra direção também. O Norte é maior do que os outros seis reinos combinados, e ele agora o Norte é meu”. E então agora Ramsay é oficialmente um Bolton, e vemos o exército marchando em direção a Winterfell. Não temos ainda uma falsa Arya, se é que teremos, mas voltar a ver Winterfell e o inverno chegando lá vai ser muito legal. Aliás, vocês perceberam o frio que fazia ali no Gargalo?

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Bom, vamos falar de Sansa. Eu sinto que Martin só não fez o que a série fez com Sansa no livro porque não se pode ser alguém mais inteligente do que Mindinho. É meio que impossível.  A série optou por fazê-lo parecer burro e sem um plano B para que Sansa pudesse ter seu momento de poder. E está tudo bem, até porque a Darth Sansa é um conceito bem interessante.

Qual a diferença dos livros? Toda. Jogaram o Festim dos Corvos pela janela. E está tudo bem. Vamos comparar algumas coisas…

UM ÁLIBI: Mindinho nos livros tem um álibi. Não se joga a Senhora do Vale pela Porta da Lua sem um. Ele tinha o bardo Marillion, que estava ali e viu tudo, o culpou, o torturou pra que confessasse (Marillion teve os olhos arrancados e alguns dedos cortados, lembram-se?). No final das contas fica subentendido que Marillion morre de tanto ser torturado, mas Sansa e Robin ainda o ouvem cantar a noite, e é assustador. Bem, este é o Mindinho dos livros.

OS LORDES, ‘SENHORES DECLARANTES’: Meus queridos, Littlefinger é o grande vencedor do jogo, saiu por cima, tramou através do caos, mentiu, matou… até que ele chega no Ninho e é esmagado pela desconfiança dos lordes. Os lordes são um negócio bem legal que a série até fez direitinho, mas infelizmente os diminuiu em número. Se tem uma coisa que fez o Mindinho ser quem ele é, é justamente a maneira com que ele sempre foi tratado pelas famílias nobres. Lorde Tully não o deixou ser feliz com Catelyn, porque ele era pobre. Então ele foi lá e arranjou toda essa bagunça que vimos nos últimos quatro anos em Game of Thrones. Quando ele consegue o que quer (um castelo só pra ele, uma menina ruiva com sangue Tully) os senhores ricos vão lá e fazem ele se sentir um cocôzinho de novo. Esse conceito está no livro e na série. Mas… no livro, Mindinho tem um dos lordes sendo agente duplo, trazendo para  tudo o que os lordes pretendem usar contra ele e etc. No caso é Lyn Corbray, e Mindinho até dá a entender que ele é pedófilo e Mindinho arranja uns garotinhos pra ele em troca de seus serviços. Bem, este é o Mindinho dos livros.

Curiosidade: Um dos lordes sentados no ‘julgamento’ de Mindinho era justamente um personagem que a série criou chamado Vance Corbray. Hum… E Yohn Royce era o pai daquele patrulheiro

E O QUE MINDINHO QUER? Sansa diz saber e fica toda bonita, parecendo responder a essa pergunta. Mas não saber o que mindinho quer é a graça da história, certo?

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Sansa foi incrível, e a série tomou o cuidado de mostrá-la mexendo na aliança de casamento na primeira cena, meio que deixando de ser a esposa de Tyrion naquele momento. Depois a vemos no quarto, sem olhar diretamente para Mindinho, costurando algo. E ela estava costurando as penas de corvo em seu vestido. Sansa passou tanto tempo presa, tendo que usar as roupas que os outros mandavam, falando o que os outros mandavam, casando-se com quem os outros mandavam… que agora ela finalmente pode ser quem ela quer, mesmo que seja longe de casa. Faz todo sentido, mas rola uma ansiedade em saber como a série vai lidar com essa mudança. Tudo o que é novo é bacana e acho que vai ser bem bom.

Há no vestido dela e no cabelo de Alayne Stone (usado pelos motivos errados) toda uma construção bacana. Sansa pode ser ‘Senhora da Ninho’ usando suas asas negras que podem ser a de uma águia, mas que também podem ser as asas ‘do passarinho do Mindinho’. E, o fato dela usar negro é a possibilidade de finalmente poder estar de luto por todas as coisas que ela passou. Além disso, a figura do corvo é em si o tema do livro quatro. Logo, tudo isso aparenta ser uma homenagem ao livro que essa cena fez questão de jogar fora e sair correndo.

Quanto ao Mindinho não ser inteligente o bastante sequer para combinar que falaria que foi suicídio com Sansa (furo bem estranho no roteiro, mas que foi resolvido como mágica)… nunca me esqueço o quanto Mindinho incomodava na segunda temporada. Aquela cena ‘power is power’ que foi tão controversa e o fato de que Aidan Gillen não parecia confortável dentro da pele do personagem, em nenhuma cena. As coisas mudaram muito na terceira temporada com o discurso da escalada da Muralha e principalmente nas cenas da quarta temporada. É um puta personagem que movimentou o mundo. E ele vai querer continuar a ter mais do que uma menina bonita bem vestida. O que ele ainda quer, e que Sansa pensa saber mas não sabe, a gente vai demorar um pouco para saber. Aliás, prefiro a ideia de que ele não sabe o que quer, mas Sansa vai fazê-lo descobrir em doses homeopáticas, manipulando-o e sendo awesome.

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Esse é o meu momento menos favorito do episódio. Embora seja muito engraçado ver a Maisie Williams insana desse jeito, rir junto e depois pensar como isso mostra que Arya está quebrada e não se conserta mais é até um exercício bacana. Aliás, aquele discurso sobre matar Joffrey com um osso de galinha exemplifica isso. Mas essa história de fazer os Stark quase se encontrarem, toda vez, sendo que a gente sabe que isso não vai acontecer é mancada. Esse pra mim é o principal problema: ficar gritando por aí que você é Arya Stark e ninguém te oferece nem um copo de água. Sor Donnel Waynwood pareceu não ligar e, se ela não é tão importante assim, qual o sentido de fazer parte de uma família?

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Quando Dany chega em Meereen nos livros, temos a luta de Belwas com o Herói, e temos Ben Mulato ajudando Dany a entender como funciona as coisas por ali. Daí ele fala pra Dany dos esgotos e tal… e ok. A noite, Dany sai pra caminhar pelas tendas do povo, pra conhecer a galera, fazer amizades. Nisso ela é atacada pelo Mero de Bravos, o Bastardo do Titã. O Arstan Barba Branca o mata com um bastão que sempre está com ele e daí a gente fica pensando: como esse velhinho é ninja…

Quando Dany conta pra Jorah, ele fica chocado ao saber que um escudeiro (sim, Barristan era escudeiro do Belwas, LOL) com seu bastão foi capaz de derrotar Mero com tanta facilidade. Daí o vovô revela que é um cavaleiro e Jorah finalmente reconhece que é Barristan, o Ousado. Jorah fica puto e fala que ele era guarda do Robert. Daí Barristan fala que fez parte de algumas reuniões do conselho e sabia que Jorah espionou Dany a mando de Varys em troca de ganhar o perdão real. Dany fica puta e manda todo mundo pro esgoto. Na volta, Meereen é dela, Barristan pede desculpas. Jorah fica ‘sentido’ e se recusa a pedir perdão. Ela manda ele as favas e ele vai. Na série…

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Dany só fica brava e manda ele ir PAH-PUTA-QUE-PARIU. E ele vai. E que dó. Ele diz que a amava, tenta falar com ela, nada adianta. A diferença da postura que o personagem de Jorah tem na relação ‘série X livro’ é bem grande. E Dany realmente parecia uma doida nessa cena, tirando ódio de onde não tinha. Gente, não tinha. E em falar em doida, nos livros, quando eles voltam dos esgotos, Barristan começa com aquelas historinhas de vovô dele pra ganhar a amizade dela. E é a primeira vez que ele manda a real sobre os Targaryen serem malucos pra ela. Ele fala algo que ele já disse na série:

Os Targaryen sempre dançaram muito perto da loucura. Rei Jaehaerys me disse uma vez que loucura e grandeza são dois lados da mesma moeda. Cada vez que um Targaryen nasce, os deuses jogam uma moeda no ar e o mundo prende a respiração para ver como ela vai pousar.”

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Jorah diz que sempre a protegeu, lutou e matou por ela. Daenerys fala por cima das palavras dele, não o deixa a chamar de khaleesi, ignorando o apelo, dizendo que ele a traiu. Jorah olha para ela e diz que ele a amava. Daenerys pergunta como ele pode dizer isso, e finalmente olha para ele . Ela diz que qualquer outro homem teria sido executado por isso. E então ela ordena que ele deixe Meereen e volte para Porto Real, para seus senhores. Ele tenta tocar a mão dela e ela o afasta, dizendo para nunca se atrever a tentar tocá-la novamente ou até mesmo falar o nome dela. Ela ordena-lhe que se vá até o anoitecer, porque se for encontrado em Meereen, sua cabeça será jogada na Baía dos Escravos… E então o vemos montado em seu cavalo, fora dos portões da cidade caminhando em direção da estrada. Tchau Jorah. Encontre Tyrion logo, ele estará sozinho e perdido, precisando de um amigo.

 

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Acho que deu para sentir falta de mais um papo entre Tyrion e Oberyn, antes que Oberyn partisse. Em Tyrion IX (pág 669), Oberyn fala para ele sobre o desejo dos Martell em coroar Myrcella. Aqui teríamos uma ótima ponte para a 5ª temporada. Nesse papo, (que é aquele que ele diz que será o campeão dele), é quando ele fala que Cersei tentou fazê-lo se interessar por ela como uma possível esposa, e que até Ellaria havia ficado empolgada com a ideia, por querer se deitar com a rainha sempre que quisesse. Quando Oberyn diz que Cersei teria que escolher Myrcella no lugar de Tommen se fosse para Dorne, Tyrion diz que Cersei teria uma difícil escolha, e que Tywin jamais deixaria. E Oberyn responde: “Seu pai pode não viver para sempre”. Tyrion acha essa frase sinistraça e fica todo arrepiado.

Outro detalhe muito importante desta conversa é o fato de Oberyn citar que foi Armory Lorch que matou a baby Rhaenys (a arrastou para baixo da cama de Rhaegar e a apunhalou até a morte). E o Montanha matou Aegon e Elia. Ou não matou Aegon, né? Se o Jovem Griff realmente for quem as pessoas dizem que ele é. Mas Armory Lorch foi comido por um urso em Harrenhal, e só sobrou o Montanha. Não há em Oberyn a intenção de fazer com que Tywin confesse quem deu a ordem, como na cena da série (que foi realmente forte e boa nesse sentido). Por que não? Porque parece que Oberyn no final das contas conseguiu dar a Tywin a sua vingança. Neste capítulo ele até pergunta a Tyrion se foi o pai que deu a ordem, e Tyrion mente dizendo que não, mas Oberyn diz que foi ele quem apresentou os dois bebês, enrolados em um manto carmesim, oras. E a obsessão não acaba aqui, falarei sobre isso mais detalhadamente já já.

O papo do besouro com Jaime foi longo, mas foi bom. Foi o que David e Dan bolaram pra gente digerir melhor a palhaçada que estava por vir. Entre inúmeras interpretações, temos uma metáfora para Gregor Clegane ser o primo Orson, já que o Montanha é conhecido por torturar, estuprar e matar sem motivo. Lembram-se da jornada de Arya a caminho de Harrenhal? Ou mesmo já em Harrenhal? Bom, também temos um papo sobre a própria estrutura da história da série que é violenta e conhecida por isso. E o último suspiro de Tyrion se mostrando inocente, já que existe uma grande diferença entre ele e o próprio Jaime nesse lance da violência, já que para Jaime é bem mais fácil matar alguém. E é por isso que ele nem vê sentido no que Tyrion diz. No livro, aquela é a primeira noite que Tyrion consegue dormir bem em muito tempo.

Apenas acho um pouco contraditório Tyrion ter sido tão curioso pela natureza selvagem de Orson e não ter sido assim com Joffrey, que era mais ou menos a mesma coisa. Mas ah, que cena, né? Muito importante Jaime ficar ali com o irmão até o último momento. Mas os sinos tocam, e chegou a hora.

 

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No livro temos ainda mais uma conversa entre Tyrion e Oberyn antes de tudo. Oberyn conta pra Tyrion que ele planeja usar uma lâmina envenenada e uma armadura leve. (Se isso fosse dito na série, ninguém estaria se perguntando se o Montanha morreu ou não.) Daí Oberyn convida Tyrion e Sansa, quando ele a encontrar, a visitar Dorne e conversar sobre a coroação de Myrcella. Oberyn comenta que Tyrion e Doran teriam muito assunto pra falar como por exemplo música, comércio, história, vinho, moeda… as leis de herança e sucessão.

 

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Oberyn também fala sobre quando visitou Lanisporto com a mãe e Elia, e essa é a continuação da história de quando Oberyn conheceu Tyrion ainda bebê. Aqui está a cereja do bolo nessa história de Oberyn querer encerrar a alegria de Tywin:

Lembra-se da historia que lhe contei quando nos encontramos pela primeira vez, Duende? – perguntou o Príncipe Oberyn, enquanto o Bastardo de Gracadivina ajoelhava a sua frente para prender suas grevas. – Não foi apenas devido a sua cauda que eu e minha irmã fomos a Rochedo Casterly. Andávamos numa espécie de demanda. Uma demanda que nos levou a Tombastela, a Árvore, a Vilavelha, as Ilhas Escudo, a Crakehall e, por fim, a Rochedo Casterly… mas nosso verdadeiro destino era o casamento. Doran estava prometido a Senhora Mellario de Norvos, portanto foi deixado para trás, como castelão de Lançassolar. Minha irmã e eu ainda não estávamos comprometidos.

“Elia achou tudo aquilo empolgante. Estava nessa idade, e sua saúde delicada nunca lhe permitira muitas viagens. Eu preferia me divertir caçoando dos pretendentes de minha irmã. Houve o Pequeno Senhor Vesgo, o Escudeiro Boca-de-Esguicho, um que chamei de Baleia que Caminha, esse tipo de coisa. O único minimamente apresentável foi o jovem Baelor Hightower. Era um rapaz bonito, e minha irmã andou meio apaixonada por ele até que o rapaz teve o infortúnio de peidar uma vez na nossa presença. Imediatamente o apelidei de Baelor Peidorreiro, e depois disso Elia não conseguia olhá-lo sem rir. Eu era um jovenzinho monstruoso, alguém devia ter cortado minha língua perversa.”

Sim, concordou Tyrion em silencio. Baelor Hightower ja não era jovem, mas continuava sendo o herdeiro de Lorde Leyton; rico, bonito e um cavaleiro de magnífica reputação. Agora chamavam-lhe Baelor Sorriso Brilhante. Se Elia tivesse se casado com ele em vez de Rhaegar Targaryen, poderia estar em Vilavelha com os filhos crescendo a sua volta. Perguntou a si mesmo quantas vidas teriam sido apagadas por aquele pum.

– Lanisporto era o fim de nossa viagem – prosseguiu o Príncipe Oberyn, enquanto Sor Arron Qorgyle o auxiliava a vestir uma túnica almofadada de couro e começava a atá-la nas costas. – Sabia que as nossas mães se conheciam desde muito antes?

– Creio recordar que tinham estado juntas na corte quando meninas. Companheiras da Princesa Rhaella?

– Exatamente. Eu estava convencido de que as mães tinham cozinhado aquela trama entre si. O Escudeiro Boca-de-Esguicho e os de sua laia, e as várias jovens donzelas cheias de espinhas que me tinham sido exibidas eram as amêndoas antes do banquete, destinando-se apenas a abrir nossos apetites. O prato principal deveria ser servido em Rochedo Casterly.

– Cersei e Jaime.

– Que anão mais esperto. Elia e eu éramos mais velhos, certamente. Seus irmãos não podiam ter mais de oito ou nove anos. Em todo o caso, uma diferença de cinco ou seis anos é bastante pequena. E havia uma cabine vazia no nosso navio, uma cabine muito boa, o tipo de cabine que poderia se destinar a uma pessoa de nascimento elevado. Como se a intenção fosse levarmos alguém para Lançassolar. Um jovem pajem, talvez. Ou uma companheira para Elia. A senhora sua mãe pretendia prometer Jaime a minha irmã, ou Cersei a mim. Talvez ambos.

– Talvez – disse Tyrion -, mas o meu pai…

– … governava os Sete Reinos, mas em casa era governado pela senhora sua esposa, ou pelo menos era o que a minha mãe sempre dizia. – O Principe Oberyn ergueu os braços para que Lorde Dagos Manwoody e o Bastardo de Graçadivina pudessem enfiar uma longa camisa de cota de malha por sua cabeça. – Em Vilavelha ficamos sabendo da morte de sua mãe e do filho monstruoso que ela dera a luz. Podíamos ter voltado naquele momento, mas minha mãe decidiu prosseguir. Já lhe contei sobre o acolhimento que encontramos em Rochedo Casterly.

“O que não lhe contei e que a minha mãe esperou o tempo que era decente, e então abordou o seu pai com aquilo que nos levara ali. Anos mais tarde, em seu leito de morte, ela contou-me que Lorde Tywin nos recusou bruscamente. Informou-a de que a filha estava destinada ao Principe Rhaegar. E quando ela perguntou por Jaime, para desposar Elia, ele ofereceu a sua pessoa.

– Oferta essa que ela recebeu como um ultraje.

– E era. Até você pode ver isso, certamente.

– Oh, certamente. – Tudo vem de trás e mais de trás, pensou Tyrion, de nossas mães e pais e dos que vieram antes deles. Somos marionetes a dançar, presos aos cordéis daqueles que chegaram antes de nós, e um dia nossos filhos ficarão com nossos cordéis e dançarão em nosso lugar. – Bem, o Príncipe Rhaegar casou-se com Elia de Dorne, não com Cersei Lannister de Rochedo Casterly. Portanto, parece que a sua mãe ganhou essa justa.

– Ela achou que sim – concordou o Principe Oberyn -, mas o seu pai não é homem para esquecer tais desfeitas. Ensinou um dia essa lição ao Senhor e a Senhora Tarbeck, e aos Reyne de Castamere. E, em Porto Real, ensinou-a a minha irmã. O elmo, Dagos. – Mandwoody entregou-o a ele; um elmo elevado e dourado com um disco de cobre montado na testa, o sol de Dorne. Tyrion viu que a viseira havia sido removida. – Elia e os filhos esperam justiça há muito tempo. – O Principe Oberyn calcou luvas flexíveis de couro vermelho e voltou a pegar na lança. – Mas hoje vão obtê-la.

Entendem como Oberyn veio a Porto Real para matar o véio Lannister? Na série não temos esse contexto, mas temos uma ideia clara de que quando Oberyn aponta para Tywin, exigindo que o Montanha diga quem foi que deu a ordem para ele matar Elia, ele está sendo apenas… um bom irmão. Não um homem obcecado e louco. Que perdeu o duelo porque foi burro e se mostrou demais.

A maneira que filmaram essa luta foi muito bonita, mas um pouquinho ‘medrosa’. Porque Oberyn por exemplo só tinha Ellaria e um escudeiro com ele em sua tenda, quando deveria estar rodeado por suas comitiva dornesa, assim como acontece nos livros. Onde foi parar aquela galera que vimos se apresentar a Tyrion no começo da temporada? Nos livros, a luta é bem de rua mesmo, com os dois no meio de uma multidão de populares ao redor. Montanha até acaba matando um deles sem querer, porque sua espada é muito longa e aquilo não é nada seguro. Na série temos essa cenografia linda que vemos na imagem acima.

 

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A série foi certeira em mostrar como o povo dornês é focado e ardente, não só no sexo e nas pimentas, mas no modo de pensar. Eu poderia me demorar aqui em falar como o figurino dessa luta é maravilhoso: a armadura de Oberyn que parece escamas de cobra e a roupa sensacional de Ellaria. Mas essa cena do beijo, com o sol apagando suas silhuetas antes do começo de tudo, já diz tanto que… é o motivo pelo qual a série é linda demais, sempre, através desses pequenos gestos com linguagem que o cinema os deixa brincar.

Todas essas frases de efeito foram muito boas: “Hoje não é o dia que eu morro “. “Eu vou matar aquilo”. “Não me deixe sozinha nesse mundo”.

“Nunca”.

O jeito que a cena da luta foi montado na sala de edição ficou bem perceptível. Muitos cortes secos em momentos oportunos, muitas câmeras aéreas onde Oberyn era na verdade o dublê. Mas mesmo assim, o resultado foi muito, muito bom! De acordo com diversas entrevistas da produção e os vídeos de bastidores, sabemos que o duelo levou uma semana inteira pra ser feito: alguns dias de ensaio e mais 3 ou 4 de gravação. Três ou quatro dias para a gente ver na TV TRÊS MINUTOS. Olha, verdade seja dita, essa cena no livro toma apenas uma quatro páginas. E eu tenho certeza que pra TV alongar isso seria ainda pior porque toda a parte da conversa estilo Dragonball Z foi bem construída. Se alongassem mais, seria mais tempo nos enganando que Oberyn poderia ganhar. E olha que por alguns momentos a série deixou essa sensação. De que seria diferente e que de alguma maneira ele viveria.

 

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Se vocês assistirem a essa entrevista maravilhosa do David e Dan no The Writer’s Room, vão perceber que a cena de Ned sendo morto, por exemplo, não foi nem um pouco ‘gore’. Eles estudaram MUITO o corte de cena perfeito para que isso não acontecesse. Tanto que a cena é LIN-DA. Então, por qual motivo, depois da segunda temporada, a série começou a ir pra esse caminho? A quarta temporada, nesse quesito, está quebrando todas as barreiras. Eu sei que a morte de Ned se trata de um ponto de vista da Arya, da época que ela estava longe de ser uma assassina e que isso faz parte da linguagem dos POVs, descrever exatamente da maneira que o personagem pensa ou vê. Mas é interessante pensar em como a série parece se desamarrar de certos nós e se superar, aliás, superar qualquer série de TV nesse sentido.

Eu falo isso porque tive muita dificuldade em assistir de novo a cena da cabeça explodindo. Do mesmo jeito que achei repugnante ver Joffrey morrer daquele jeito, roxo e gorfando, sangrando pelos olhos. No caso do Oberyn, que é um ator querido por todos, tá sendo meio foda. O Tumblr tá meio fora de controle, aliás. E é esse meu ponto lá do começo desse texto. A série não pode deixar de querer sempre se superar e glamorizar o sangue e as paradas mega loucas que George criou. Mas, ao glamorizar, banaliza. E através da repetição, dos memes e da zoeira da galera a gente consegue superar essas coisas muito rápido.

E eu me recuso a superar isso.

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E quer saber? O Oberyn também, gente. Ele se recusa, e aponta pro vovô, exige que o Montanha diga. QUEM TE DEU A ORDEM? QUEM TE DEU A ORDEEEEEEEEM? VOCÊ MATOU OS FILHOS DELA! “Você a estuprou! Você a matou!” “DIGA!”

Oberyn corre em círculos, pula, dá cambalhotas, mortais. É lindo, é artístico e intenso. O Montanha é apenas duro, pesado e irritado. Mas forte. Muito forte. Nos livros ele é até alguém com mais personalidade, por incrível que pareça, mostrando-se irritado com o falatório. “Elia Martell!” ruge a Montanha, enquanto os gritos de Oberyn crescem em sua agonia. “Eu matei seus filhos, e então a estuprei! Então eu esmaguei a cabeça: as-sim!” A multidão grita, Ellaria grita de terror.

É como um sábio comentarista escreveu neste post do AV. Club: Neste episódio, você sente a mão pesada de George RR Martin em torno de sua cabeça, esmagando suas esperanças enquanto ri de você e do outro lado Ramsay Bolton está chamando você Fedor”. Alex Graves fez um belo trabalho em todas as cenas e trazer esse senso de brutalidade que é tão inédito, irreal e ao mesmo tempo tão verdadeiro. Deixando todo mundo com a alma quebrada: Sam, Ellaria, Jorah, Arya, Reek… e a gente.

Oberyn deixou uma marca definitiva na série de TV e fez com que a família Martell fosse muito bem posicionada na cabeça das pessoas. Acho isso lindo, e queria que Oberyn tivesse vivo para levar Tyrion para passear, brincar com as filhas, beber, dançar, pegar uma galera, beijar Ellaria quantas vezes ele pudesse e ela quisesse. Oberyn era um homem que gostava muito de viver, tanto, que sempre estava dançando muito perto da morte. Imagine você, carregar por mais de quinze anos a ideia de vingar a sua família, sua irmã querida, seu sangue. Você também não faria questão de fazer isso do jeito mais elegante possível?