Com o título mais genérico desde “The Wars to Come”, “Home” – dirigido por Jeremy Podeswa e escrito por Dave Hill – foi um dos episódios mais bem intitulados de Game of Thrones, e relativamente melhor do que seu antecessor. Foi também um dos mais focados e menos entrópicos, onde não apenas Jon, como todos os personagens ganharam um novo sopro de vida e recolheram os cacos deixados ao longo das outras cinco temporadas para tentar seguir em frente. Esse é o primeiro e um dos mais nítidos sinais de que uma história está se aproximando do clímax (e, consequentemente, do fim).
Além da Muralha (e do tempo)
O capítulo começa com o retorno de Bran, que vimos pela última vez no season finale da 4ª temporada. Em “The Children”, quando o Corvo disse que Bran “voaria”, muitos suspeitaram que ele estava sendo figurativo, mas aposto que poucos pensaram em algo tão surreal quanto viagens no tempo. Enquanto nos livros, Bran só consegue enxergar outros lugares e outras épocas por meio dos olhos nos represeiros, na série, as raízes parecem ser as principais portas para essa magia, o que faz com que ele possa, teoricamente, ir para qualquer lugar.
Primeiro, fomos transportados para um lugar familiar, em uma situação ainda mais nostálgica, que remeteu a uma das primeiras cenas do primeiro episódio da série. Vimos o pequeno Ned Stark treinando com o irmão Benjen sob a supervisão de um jovem ser Rodrik (com suíças e tudo), e até soltar uma frase que Jon usou em “The Wars to Come” enquanto treinava Olly (ugh, Olly) no pátio de Castelo Negro. Esses paralelos têm sido como um padrão nesse início de temporada—como Sansa aceitando os serviços de Brienne usando as mesmas palavras usadas por Catelyn. Essas sutis conexões ajudam a fazer com que os laços estabelecidos entre os personagens pareçam um pouco mais significativos.
Alguém aí também achou a intérprete da jovem Lyanna ligeiramente parecida com um certo bastardo? E por que decidiram focar tanto a história do menino Hodor/Wylis (nos livros, o nome dele é Walder) se não for para explicar todo o seu mistério mais a frente? Algo me diz que voltaremos a essa visão e, sinceramente, estou ansioso por isso. Em uma saga onde o passado é sempre presente e importante, esses flashbacks podem se tornar uma poderosa ferramenta narrativa.
Todos os atores escolhidos desempenharam perfeitamente os seus respectivos papéis, mas o destaque vai para o veterano Max von Sydow, que esteve excelente como o Corvo de Três Olhos, mesmo com poucos minutos de tela. A Filha da Floresta também sofreu recast, e, por algum motivo estranho, está sendo interpretada por uma atriz adulta. Minha única crítica vai para a caracterização desses dois personagens, que mudou bastante desde a última vez que os vimos, o que é ruim por questões de continuidade.
Só espero que Bran não seja usado unicamente como um veículo para guiar os telespectadores pela história de Westeros (a conversa final entre Folha e Meera sugeriu que os poderes dele não se restringirão a isso). Game of Thrones sempre se orgulhou do seu realismo, e embora esse mergulho na fantasia tenha sido prazeroso até agora, é preciso cuidado para não se afogar.
Porto Real
Nesse episódio, vimos ser Robert Strong em ação pela primeira vez. Quando Qyburn disse a Cersei que o monstro não descansaria até que todos os inimigos dela fossem exterminados, ele não estava brincando. Ter a cabeça esmagada por causa de piadas inofensivas contadas sob efeito do álcool pode parecer um pouco supérfluo, mas a cena serviu para nos mostrar do que o Montanha é capaz. A reação de Cersei quando a criatura retorna a seus aposentos suja de sangue também foi intrigante. Ela percebeu que ele vem cumprindo sua missão efetivamente, mas, ao mesmo tempo, pudemos ver um vestígio de preocupação em seu rosto.
Uma coisa que me incomodou na interação entre Tommen e Jaime é o fato de que o rei parece não ter a mínima ideia de que o tio é seu verdadeiro pai. Enquanto Myrcella, que passou ANOS em Dorne, estava a par da situação, o Senhor dos Sete Reinos é completamente absorto. Sabemos que o personagem é frequentemente retratado como ingênuo e tolo, mas a ignorância dele diante dessa realidade gritante foi meio difícil de engolir. Pelo menos Tommen está ciente de suas deficiências, tanto que recorre à mãe para que ela o ajude a se tornar um governante mais forte. Com o reino em desordem e os Pardais aumentando o controle sobre a capital, a sobrevivência dele pode depender da capacidade de mudar, mas Cersei parece acreditar mais na profecia do que no próprio filho.
O diálogo entre Jaime e o Alto Pardal no Septo de Baelor foi provavelmente a melhor coisa que Dave Hill já escreveu para a série. A indiferença com que o religioso reage às ameaças do Regicida mostra o quão confortável ele se sente naquela posição. Quando membros da Fé Militante surgem, o Senhor Comandante da Guarda Real entra em um dilema: mesmo que ele matasse o Alto Pardal, jamais conseguiria derrubar tantos homens com uma única mão. E mesmo que conseguisse, a morte do Pardal só serviria para transformá-lo em um mártir. Enquanto o velho esfrega esse escudo na cara de Jaime, o sorriso em seu rosto é de alguém que não parece tão desprendido e temente aos deuses quanto quer que todos acreditem.
Essos
Não vimos Daenerys essa semana, mas seu Pequeno Conselho esteve bem ocupado reagindo às notícias de Astapor e Yunkai, cidades que a rainha passou temporadas libertando da escravidão, e que agora retornaram para as mãos dos escravagistas. Varys sabe que isso é um problema, mas Tyrion pareceu mais preocupado com piadas de eunuco e, claro, dragões!
Fica fácil esquecer que Peter Dinklage é um grande ator quando seu personagem é constantemente reduzido a frases do tipo “Eu bebo e sei das coisas” mas vê-lo em cena com aqueles incríveis dragões de CGI me fez perceber o quanto o cara precisa ser bom para conseguir passar verdade naquilo. A facilidade com que o Duende conseguiu se aproximar dos dragões foi, no mínimo, questionável. Foi quase como se ele tivesse consciência da sua imunidade de “protagonista”. Mesmo assim, a cena foi bem feita, e pode ter servido para reforçar uma antiga teoria dos fãs.
Vale lembrar que Dany teve motivos para acorrentar Rhaegal e Viserion dentro da cripta. No momento não dá pra dizer se Tyrion tomou a decisão correta ao libertá-los, mas uma coisa é certa: da próxima vez que ele quiser dar uma Quentyn Martell, vai precisar de mais bebida.
Desde que foi para Bravos, Arya se tornou um personagem meio subutilizado, o que é bem triste. Maisie Williams é uma das atrizes que mais evoluiu daqueles tempos para cá. A curta participação dela neste episódio não foi muito diferente do que vimos em “The Red Woman”, mas ao menos tivemos uma progressão no arco. Apesar dos criticados cortes de edição, a luta foi bem coreografada, e o resultado mais do que satisfatório.
Como Theon e Bran, Arya retornará para “casa”.
Winterfell e arredores
Em um episódio onde tudo pareceu funcionar tão bem, a Winterfell dos dias atuais, em total contraponto ao flashback de Bran, foi a triste exceção.
Livrar-se de Roose Bolton usando, basicamente, o mesmo recurso que usaram para dar fim à Casa Martell no episódio anterior denota uma inquietante falta de criatividade dos nossos roteiristas. Matá-lo daquela forma foi certamente o mais óbvio e menos complexo caminho para dar seguimento ao núcleo. A aparente pressa dos produtores em “limpar” o elenco da série faz com que reviravoltas desse tipo passem por cima do “choque pelo choque” e se transformem em algo meramente banal.
O enquadramento da cena foi semelhante ao utilizado quando Roose desferiu o golpe fatal em Robb Stark durante o Casamento Vermelho. Uma rima visual clara, mas que não teve peso suficiente para aplacar o desejo de justiça dos fãs. A morte de um personagem odiado é um consolo pequeno quando serve aos propósitos de outro ainda pior.
Sabemos que o Ramsay é mal porque 1) ele esfola as pessoas; 2) ele torturou, humilhou, e castrou Theon; 3) ele caça mulheres com cachorros; 4) ele estuprou Sansa; 5) ele serviu o corpo da amante de comida para os cachorros e, agora, 6) ele matou o pai e soltou seus cães famintos em cima da nossa Frey favorita e do meio irmão RECÉM-NASCIDO (já faziam MESES que Walda estava grávida?). Não foi a primeira vez que vimos bebês sendo assassinados em Game of Thrones, mas, sério, nós já entendemos que a maldade de Ramsay não conhece limites. Sinto que muito mais poderia ser feito com o personagem se parassem de escrevê-lo como esse vilão cartunesco que está se tornando cada vez mais chato.
A cena do canil foi bizarra. Tanto que até o novo Lorde Bolton, sádico como ele é, desviou o olhar da carnificina. Não pude deixar de lembrar da doce Shireen Baratheon, que teve uma morte terrível pelas mãos da Melisandre e do próprio pai (e até hoje não foi mencionada em uma conversa pelo Cavaleiro das Cebolas). Assim como o sacrifício da princesa foi eclipsado pela sequência da Arena de Daznak em “The Dance of Dragons”, a morte da pobre Walda será lamentavelmente esquecida, graças à apoteótica ressurreição de Jon Snow. Coincidência?
Até esse episódio, eu gostava da ideia de que Ramsay iria, em algum momento, peitar o pai pela primeira vez, mas não foi exatamente o que aconteceu. Ramsay mata porque Ramsay mata. Na minha última análise, eu avisei que era perigoso usar a esposa grávida para ameaçar a legitimidade do bastardo. Como disse Tyrion no episódio “A Man Without Honor”, é difícil colocar uma coleira em um cachorro, uma vez que você tenha posto uma coroa em sua cabeça. Roose Bolton aprendeu essa lição um pouco tarde demais.
A despedida de Theon e Sansa foi bem tocante. Ainda que ele se achasse indigno de perdão, Sansa o perdoou do mesmo jeito, colocando de lado todos os pecados que ele confessa ter cometido contra a sua família, o que já é um grande passo na jornada de redenção do personagem. Depois de tudo que atravessaram juntos, ela passou a amá-lo como um irmão—certamente mais do que quando eles viviam em paz em Winterfell, antes de Ramsay. Aliás, unir esses dois deve ter sido a única coisa boa que o bastardo fez na vida.
Pyke
Enquanto Theon segue para as Ilhas de Ferro, seu pai, que não vimos desde a terceira temporada, lamenta o fracasso de sua conquista do Norte. Toda a discussão inicial entre ele e Yara gira em torno disso. Os homens de ferro foram tão esquecidos na série, que Balon ganhou a Guerra dos Cinco Reis por W.O.! Mas os dias de glória do Senhor Ceifeiro de Pyke já estavam contados. Melisandre e Stannis disseram o nome dele quando atiraram sanguessugas no fogo no episódio “Second Sons”. E havia uma tempestade em seu caminho.
É difícil sentir qualquer conexão com um personagem depois que ele é deixado de lado por tanto tempo (a não ser que esse personagem seja Bran Stark), mas a cena da ponte deve ter servido para despertar a curiosidade de alguns. Por que David e Dan decidiram reviver este núcleo? Que papel Theon desempenhará na Assembleia de Homens Livres? Que tipo de consequências a chegada de Euron trará para a história?
Pilou Asbaek é um grande ator (quem assistiu a maravilhosa série dinamarquesa Borgen sabe do que eu estou falando) e quem leu os livros sabe que Euron Greyjoy tem tudo para ser o novo Oberyn Martell da adaptação… com uma dose extra de loucura, misticismo, e crueldade.
Só peço ao Deus Afogado (aos Sete, ao deus vermelho e até aos deuses das árvores) que as Ilhas de Ferro não sejam a nova Dorne.
Castelo Negro
Aconteceu. Ele está vivo!
Há algumas temporadas atrás, quem diria que a Muralha se transformaria em um dos núcleos mais excitantes e vitais de toda a série? A chegada de Stannis, Melisandre e Davos; a inclusão dos selvagens e a revelação de que os Caminhantes Brancos são o verdadeiro perigo—tudo convergiu para Castelo Negro. Claro que os gigantes também ajudaram.
O fim do conflito entre os irmãos negros que estavam a favor e contra o assassinato do Lorde Comandante foi forçado com a chegada de Edd, Tormund e o povo livre. É fácil entender que, com tantas coisas acontecendo paralelamente, o tempo para mostrar esses embates acaba ficando limitado. E certamente entendemos por que os homens da Patrulha entregaram as armas quase sem hesitar. Ninguém queria enfrentar Wun Wun.
Foi curioso assistir Davos pedir ajuda a Melisandre. Era a mulher vermelha que costumava pregar para o ex-contrabandista, afim de trazê-lo para o seu rebanho, mas dessa vez os papéis se inverteram. Convencido por todas as coisas inexplicáveis que ele já viu ela fazer, Davos conseguiu levantar o espírito quebrado e sem esperanças da sacerdotisa (que, pela primeira vez, estava até vestindo um casaco), mas as motivações dele para se devotar tanto ao Jon continuam um pouco vagas para mim.
Zyhys oñoso jehikagon Aeksiot epi, se gis hen syndrorro jemagon.
(“Nós pedimos ao Senhor para brilhar sua luz e guiar uma alma para fora da escuridão.”)
Zyhys perzys stepagon Aeksio Oño jorepi, se morghultas lys qelitsos sikagon.
(“Nós imploramos ao Senhor que compartilhe seu fogo e acenda uma vela que se apagou.”)
Hen syndrorro, oños. Hen ñuqir, perzys. Hen morghot, glaeson.
(“Da escuridão, luz. Das cinzas, fogo. Da morte, vida.”)
(Oração publicada e traduzida por David J. Peterson, criador do valiriano para a série, logo depois da exibição do episódio)
A composição do cenário e o uso da iluminação fizeram com que a última sequência lembrasse uma pintura barroca de Caravaggio, o que deve ter contribuído para o ar de suspense do ritual de ressurreição. Eu não esperava que a tentativa de Melisandre fosse funcionar, e essa certamente foi a intenção do diretor. Toda a tensão se dissolveu quando os participantes deixaram o cômodo, acreditando que a magia tinha falhado. Então, quando os telespectadores já estavam todos sentados nas pontas dos seus sofás, a câmera vira para Fantasma, que parece pressentir o retorno do companheiro. Finalmente, Jon Snow abre os olhos, levantando com ele dezenas de perguntas que só devem ser respondidas no próximo domingo.
A morte de Jon foi um recurso utilizado para livrá-lo do juramento da Patrulha? Foi realmente Melisandre quem o reviveu? O personagem continuará sendo ele mesmo?
A única pessoa que voltou dos mortos na série foi o líder da Irmandade Sem Estandartes, Beric Dondarrion (EDITADO: também temos o simpático Montanha, mas ele passou por outro processo). Ele foi ressuscitado inúmeras vezes pelo amigo, o também sacerdote vermelho Thoros de Myr, que Melisandre conheceu no sexto episódio da terceira temporada, “The Climb”. Naquela ocasião, Beric confessou que, a cada ressurreição, ele se tornava um pouco menos do que ele costumava ser.
Ainda é impossível dizer se Jon retornou como a mesma pessoa que liderou a Patrulha da Noite e estava se preparando para combater um exército de mortos-vivos vindos de além da Muralha. Se lembrarmos de um dos últimos conselhos do meistre Aemon, talvez encontremos uma resposta:
“Mate o menino, e deixe o homem nascer.”