Sim, George R. R. Martin é uma espécie de avô dos wookiees de Star Wars. A influência mútua dentro da ficção especulativa não é nenhuma novidade, e este é mais um caso: a aparência de Chewbacca tem origem indireta no autor de As Crônicas de Gelo e Fogo. Essa história começa durante os anos 1970, e envolve, além dos Georges – R. R. Martin e Lucas –, os artistas John Schoenherr e Ralph McQuarrie.
George Lucas começou a escrever os primeiros tratamentos para Star Wars no início da década de 1970. No esboço de 1974, ele descreveu os wookiees como “enormes feras cinzas e peludas”. No final daquele ano, Ralph McQuarrie foi contratado pela Lucasfilm como artista conceitual, e começou a trabalhar no projeto em 1975.
Nas primeiras artes, McQuarrie desenhou Chewbacca com uma aparência lêmure (que acabou servindo de base para uma espécie posterior, os lasat). No entanto, não foi essa ideia inicial a que ficou. Nas palavras do próprio Ralph:
George também me deu um desenho de que ele gostava, de um ilustrador de ficção científica dos anos 1930, que retratava uma fera grande, peluda, parecida com um macaco, com uma coluna de seios femininos ao longo do peito. Então tirei os seios e incluí uma bandoleira e munição e armas, e mudei o rosto até que pareceu mais com o personagem final, e deixei assim.
(Ralph McQuarrie on Designing Star Wars. starwars.com. 20 de setembro de 2004. Tradução minha.)
A arte conceitual de McQuarrie para Chewbacca, em 1976, ficou assim:
Não se sabe quem, entre McQuarrie ou Lucas, se confundiu, mas a verdade é que a ilustração em questão não era de 1930. A descrição feita por Ralph bate exatamente com uma arte criada apenas um ano antes. Com efeito, esta ilustração de John Schoenherr:
A ilustração foi publicada na revista Analog Science Fiction, de julho de 1975, para o conto E, Sete Vezes, Nunca Mate o Homem, de George R. R. Martin. Na época, a maioria das histórias de Martin eram de ficção científica, ambientadas em seu universo dos Mil Mundos. E, Sete Vezes, Nunca Mate o Homem foi escrita em 1974, e acompanha um comerciante humano que chega a um planeta habitado pela espécie jaenshi. É esse povo o retratado na arte de Schoenherr, que se baseou na descrição deles presente na noveleta.
Michael Heilemann observa que na arte conceitual de McQuarrie, de 1976, a arma de Chewbacca seria um blaster genérico. Na versão final de Chewie em Uma Nova Esperança, porém, o wookiee portava sua balestra característica, que é também claramente inspirada nos jaenshi de Schoenherr, que carregam espécies de bestas.
É dessa forma, portanto, que George R. R. Martin indiretamente influenciou a aparência dos wookiees de Star Wars. Em 2014, o autor foi perguntado sobre o assunto, mas, pela resposta, parece nunca ter dado muita importância a ele:
John Schoenherr, um dos grandes artistas de ficção científica, pintou uma capa para uma história minha chamada “E, Sete Vezes, Nunca Mate o Homem”. Se essa arte teve algum impacto em Lucas e em seus desenhistas, ou se eles sequer a viram, não sei dizer… mas a aparência certamente é similar.
(Martin, George R. R.. Comentário em A Trailer for Telltale. Not a Blog. 4 de dezembro de 2014. Tradução minha.)
Mais recentemente, George chegou até a se confundir a respeito:
“E, Sete Vezes, Nunca Mate o Homem” foi um dos meus contos perdedores do Hugo (e a base para a famosa capa de John Schoenherr para a Analog que alguns dizem que inspirou George Lucas a criar os Ewoks, pelo que eu não aceito absolutamente nenhuma culpa).
(Martin, George R. R.. NIGHTFLYERS Re-release Scheduled. Not a Blog. 18 de janeiro de 2018. Tradução minha.)
Na verdade, apesar de ewoks e wookiees serem espécies diferentes, a confusão pode não ser tão grande. A intenção inicial de Lucas para O Retorno de Jedi era que os wookiees confrontassem o Império; só depois é que foram substituídos pelos ewoks – também uma raça peluda, mas mais fofinha e tecnologicamente menos desenvolvida. Se George R. R. Martin é uma espécie de avô dos wookiees, ele pode ser, assim, um bisavô dos ewoks também.
Sendo um autor tão envolvido com a ficção científica, Martin já foi perguntado algumas vezes sobre Star Wars. Ele revelou que gostou dos dois primeiros filmes (e Rogue One), mas nem tanto do terceiro, e não gosta dos episódios I, II e III. Em seu blog, George também já questionou a afirmação de que Uma Nova Esperança é o melhor filme de ficção científica de todos os tempos. Também já desmentiu rumores de que o trailer de O Despertar da Força teria lhe dado uma injeção de inspiração para escrever Os Ventos do Inverno.
Ainda assim, existe outra possível ligação entre Martin e Star Wars. A icônica trilha de abertura de Game of Thrones, composta por Ramin Djawadi, lembra bastante uma parte de Confrontation with Count Dooku, de John Williams. Ela faz parte da trilha sonora do Episódio II de Star Wars, e é ouvida no final do filme, quando o exército clone é mostrado perfilado em Coruscant.
A parte específica da música de Williams pode ser ouvida aqui. Nesse caso, como apontou Felipe Medeiros, não é possível saber se a situação foi coincidente ou proposital. Djawadi pode ter feito uma citação, pode conhecer o trecho de Williams e tê-lo usado como uma lembrança involuntária em sua composição, ou pode ter ocorrido realmente uma coincidência perfeita.
Os créditos dessa descoberta sobre os wookiees vão para várias fontes: um excelente texto sobre Chewbacca no Kitbashed (um site especializado nas origens de Star Wars), um post na Wertzone, e uma postagem ainda mais antiga no blog Flooby Dooby.
Para conhecer mais sobre E, Sete Vezes, Nunca Mate o Homem, você pode acessar a página especial do conto, além de nosso Guia dos Mil Mundos, sobre as mais de 20 histórias de ficção científica de George R. R. Martin. O conto pode ser lido na coletânea RRetrospectiva da Obra, lançada no ano passado no Brasil.